Thunderbolts* (2025): Redenção em Tempos de Sombra

Thunderbolts* traz anti-heróis quebrados num confronto intenso com o Void. Uma história de dor, redenção e empatia no lado sombrio do MCU.

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Racnela

5/5/20259 min ler

Thunderbolts* (2025)

Análise: Quando os Derrotados se Unem para Salvar o Mundo

O Universo Cinematográfico da Marvel avança para um novo território com Thunderbolts, um filme que troca o heroísmo tradicional por personagens que vivem à margem da glória. Aqui, os protagonistas não são os mais fortes, nem os mais nobres. São os mais quebrados. Os mais humanos. Aqueles que erraram e continuam a carregar os estilhaços das suas escolhas. Sob o olhar calculista de Valentina Allegra de Fontaine, forma-se uma equipa de anti-heróis que, à partida, não deveriam confiar uns nos outros. No entanto, são unidos por algo mais profundo do que uma missão: a dor comum e o desejo de se tornarem algo mais.

Desde os primeiros minutos, Thunderbolts destaca-se dos seus antecessores no MCU. É sombrio, mas não cínico. É emocional, mas não melodramático. E é, acima de tudo, honesto. O filme não finge que estas personagens são exemplos. Mostra-nos antes que são pessoas à procura de redenção. De sentido. De um lugar onde possam simplesmente… existir.

Como diz Bob, num momento de introspeção quase poético:
"A sombra não mata. Apenas lembra-nos do que deixámos para trás."

Sem Spoilers

Realizado por Jake Schreier, Thunderbolts* é um drama de ação com alma. É mais sobre o que não se diz do que sobre o que se grita. A fotografia usa a escuridão de forma inteligente, e o silêncio, por vezes, pesa mais do que qualquer explosão. A cidade de Nova Iorque, mergulhada no vazio do Void, torna-se um espelho dos estados emocionais dos protagonistas.

Yelena Belova (Florence Pugh) é o coração moral da história. A sua jornada não é sobre glória, mas sobre tentativa. Tentativa de ser algo mais do que uma sombra do passado. A ligação com Bob (Lewis Pullman) é central, mostrando-nos duas pessoas profundamente marcadas, mas que ainda conseguem ver o outro. Não como soldado. Mas como ser humano.

Bucky Barnes (Sebastian Stan) regressa num dos seus melhores desempenhos, dando profundidade ao cansaço moral da personagem. A sua luta não é externa. É contra a memória, contra a dúvida, contra a culpa. A frase que partilha mais tarde com Mel, a assistente de Valentina, resume essa tensão:

"Eu não escolhi ser quem fui. Tu tens opção."

Red Guardian (David Harbour) oferece o alívio cómico, mas também uma vulnerabilidade rara. Quer ser mais do que uma piada, e por isso, cada risada que provoca tem um fundo de melancolia.

Com Spoilers

A morte de Taskmaster: silêncio e esquecimento

Antonia Dreykov, a Taskmaster, tem um dos arcos mais curtos e controversos do filme. Desde Black Widow que a personagem dividiu opiniões, e Thunderbolts parece decidido a fechar esse capítulo. Reaparece brevemente, com direito a uma nova sequência de ação que nos recorda do seu potencial. Mas é tudo fugaz.

Ghost abate-a com um tiro à queima-roupa, sem hesitação, ao descobrir que a missão em que estavam era uma armadilha de Valentina. Taskmaster cai, sem palavras, sem glória. John Walker observa e murmura:
"Ela era melhor do que todos nós. E mesmo assim não viu o disparo."

A Marvel parece ter decidido retirar a personagem de cena. E fá-lo com uma frieza que acentua a ideia de que esta Taskmaster nunca encontrou o seu lugar no MCU.

Valentina e a Watchers Tower: o disfarce da autoridade

Valentina Allegra de Fontaine é a mente por detrás de tudo. Compra a antiga Avengers Tower e transforma-a no quartel-general dos autoproclamados “Novos Vingadores”. Na prática, reconstrói a marca dos Vingadores como uma ferramenta de propaganda, ocultando o seu verdadeiro objetivo: manter o controlo.

Ao apresentar a equipa como novos heróis à imprensa, declara:
"Se os heróis não voltam, que venham os que ainda sabem obedecer."

Mas a sua manipulação não passa despercebida. No final, Yelena aproxima-se dela e sussurra:
"Agora pertenceste-nos."
Uma ameaça silenciosa. Um aviso de que o jogo mudou.

Yelena e Bob: a luz no meio do vazio

O vínculo entre Yelena e Bob é o fio condutor emocional do filme. Bob, atormentado por uma vida de dor e sofrimento psicológico, vê o seu poder amplificado a um ponto em que perde o controlo. O projeto Sentry deveria salvá-lo. Em vez disso, libertou o Void, uma entidade que vive da dor humana.

Quando o Void cobre Nova Iorque, transforma a cidade num deserto emocional. Não destrói edifícios. Destrói dentro. Mergulha as pessoas nos seus piores traumas. Alimenta-se da culpa, da solidão, do medo. É uma ameaça maior do que qualquer outro vilão do MCU — não pela força, mas pela forma como penetra na mente.

Yelena compreende que a única forma de salvar Bob é enfrentando o que ele teme. Ela faz o sacrifício final. Entra nas sombras por vontade própria, sabendo que pode não voltar. Fá-lo porque acredita em Bob. Porque acredita que, mesmo no centro do vazio, ainda há algo de bom.

"Tu não és só isto. Eu também vivi na sombra. E escolhi sair."

É um momento de coragem silenciosa. E transforma tudo. Com um abraço, o Void começa a dissipar-se. Os outros seguem o exemplo. A salvação não vem da força. Vem da empatia. Do gesto humano.

John Walker: reconquistar o nome

John Walker, o antigo US Agent, é o exemplo de alguém que caiu… e que decide levantar-se. Já não procura a aprovação do sistema. Quer provar que é capaz de fazer o bem. Quando Valentina lhe ordena matar Bob, ele recusa.

"Já matei por bandeiras. Nunca mais mato por mentiras."

Essa escolha define o seu arco. Walker não quer ser herói de papel. Quer ser homem. E, neste filme, dá o primeiro passo nessa direção.

Bucky Barnes: a sombra que caminha connosco

Bucky volta a agir como Winter Soldier. Não porque quer. Mas porque é necessário. O peso da sua história continua a assombrá-lo, mas desta vez, ele decide enfrentá-la.

Enquanto lida com o passado, Bucky também começa a envolver-se no presente de uma forma nova: politicamente. Ainda que desconfortável com o palco mediático, ele percebe que o heroísmo também passa por desafiar estruturas injustas e expor manipulações como as de Valentina. A sua postura mais cética torna-se um contrapeso importante ao espetáculo de fachada que se tenta montar em torno dos “Novos Vingadores”.

É uma declaração de responsabilidade. Mas também de dor. No final, é ele quem segura Yelena quando tudo acaba. Não precisa de falar. Está ali. E isso basta.

Red Guardian: o herói invisível

Red Guardian quer apenas ser lembrado. Quer que alguém reconheça que ele foi, durante um breve momento, alguém importante. A sua cena pós-créditos, num supermercado, diz tudo:

"Sou eu. Vês? Está aqui. O grande guardião vermelho. Compra dois... é promoção."

É uma piada. Mas também é profundamente humano.

Pós-créditos: Os "Novos Vingadores" e a Mentira Bem Contada

A cena pós-créditos contrasta com a profundidade emocional do clímax. Valentina organiza uma conferência de imprensa para apresentar oficialmente os Thunderbolts como os "Novos Vingadores". Na Watchers Tower, renomeada em sua honra, a equipa é exibida como a nova linha de defesa do mundo.

Mas quem viu o que realmente aconteceu sabe que tudo é uma encenação. Os membros da equipa estão emocionalmente exaustos, ainda a digerir perdas reais. Yelena aproxima-se de Valentina e sussurra:

We own you now.

É assim então que o filme nos mostra que o seu nome real é Novos Vingadores.

Mas a verdadeira ironia está por vir. No meio do evento, surge um alerta. Uma nave aproxima-se da Terra. No ecrã, o símbolo é claro: o número 4. É a chegada do Quarteto Fantástico. Uma nova era aproxima-se.

Ao mesmo tempo, Bucky comenta em privado que Sam Wilson está a processar Valentina por usar o nome "Avengers" sem autorização. O conflito ideológico está lançado. Os "verdadeiros Vingadores" contra os impostores polidos para as câmaras.

Red Guardian, tentando aliviar o clima, propõe:

"Mudamos o S por um Z. Vingadorez. É mais moderno."

É patético. E absolutamente hilariante. Mas também revela o desconforto que a equipa sente ao ser usada como rosto de uma mentira polida.

Análise simbólica: o Void como espelho da depressão

O Void não é apenas um antagonista. É uma representação visual e emocional da depressão. Ele transforma a dor pessoal em escuridão coletiva. Cobre a cidade. Isola as pessoas. Mergulha-as em memórias que não querem revisitar. Não destrói por raiva. Destrói por tristeza.

Bob, como Sentry, não foi o homem certo para aquele poder. Como diria o Dr. Erskine em Captain America: The First Avenger:

The serum was not ready. But more important, the man. The serum amplifies everything that is inside. So good becomes great. Bad becomes worse.

Bob não era mau. Era um homem profundamente ferido. E o soro apenas tornou a dor insuportável.

É aqui que o filme dá a sua maior volta. Evita o cliché do final épico. Não há combate final tradicional. O Void é vencido por algo diferente. Algo raro no cinema atual.

Uma vitória sem explosões!

O filme poderia terminar com uma luta espetacular. Mas não o faz. Em vez disso, leva-nos a uma conclusão surpreendente: o vilão é derrotado pelo poder da empatia.

Não é um gesto simbólico vazio. É um abraço verdadeiro. Um gesto simples. Mas devastador para uma entidade como o Void, que só conhece o isolamento.

Yelena entra nas sombras, sozinha, porque acredita que Bob pode ser salvo. Quando o encontra, não o convence com lógica. Abraça-o. E nesse gesto, comunica o que palavras não conseguem.

Os outros seguem-na. Um a um. E o Void desaparece. Porque já não há medo. Porque ninguém está sozinho.

"Ajudar não é salvar. É ficar ao lado, quando ninguém mais fica."

Esta frase define o filme. E ele mostra isso com brilhantismo.

A atuação de Lewis Pullman como Bob é, sem dúvida, um dos pontos altos. Consegue transmitir o desespero silencioso de alguém que se perdeu dentro de si. Quando finalmente se permite ser abraçado, o alívio que passa pelo olhar diz mais do que qualquer diálogo.

Thunderbolts mostra-nos que a dor só cresce quando é vivida no silêncio. E que a verdadeira vitória vem quando alguém escolhe ficar ao nosso lado. Mesmo no escuro.

Entre a Dor e a Redenção

Thunderbolts não é apenas mais uma entrada na longa lista de filmes do MCU. É uma mudança de paradigma. É um lembrete de que o heroísmo pode existir mesmo nos que tropeçam, mesmo nos que sangram, mesmo nos que já desistiram de tentar.

Yelena, John, Bucky, Red Guardian, Ghost e Bob não são os heróis que esperávamos ver num cartaz com o nome "Vingadores". Eles não têm legados dourados nem frases feitas para a imprensa. Mas têm algo que muitos heróis clássicos perderam ao longo do tempo: a capacidade de se ligar aos outros pela dor, pela falha, pela tentativa.

O momento final do filme não termina com uma estátua erguida, nem com uma vitória gloriosa diante das câmaras. Termina com um grupo de pessoas que, pela primeira vez, olham-se sem julgamento. E entendem-se.

Uma das frases mais tocantes do filme vem do improvável Red Guardian, quando diz à sua filha adotiva:

Yelena, when I look at you, I don’t see your mistakes.

Essa frase não se aplica só à Yelena. Aplica-se a todos os que ali estão. E, por extensão, a todos nós. Porque quem nunca falhou? Quem nunca quis apagar o que fez? O filme olha-nos nos olhos e responde com firmeza: os erros não nos definem. Mas o que escolhemos fazer depois deles sim.

Esta obra ousa mostrar que a verdadeira força não está em vencer sozinho. Está em pedir ajuda. Em aceitar um abraço. Em caminhar de volta à luz depois de demasiado tempo no escuro. O Void é vencido pela proximidade, pela empatia, pela recusa em abandonar o outro.

Being a hero, there is no higher calling.

Ser herói, afinal, é isso. É ouvir sem julgar. É ficar quando os outros fogem. É ser âncora quando alguém está a afundar.

Thunderbolts não é um conto de fadas. É um grito de dor transformado em abraço. Uma ode aos imperfeitos. Um filme que nos diz, sem medo e sem vergonha, que ser quebrado não significa ser inútil. Significa apenas que ainda há algo para reconstruir.

No fim, não importa quem fomos. Importa quem decidimos ser agora.

Essa é a verdadeira lição.

The past doesn't go away. So you can either live with it for ever, or do something about it.

  • Nota IMDb: 7.7
  • Nota Aranha Velocista: 10
Thunderbolts Poster
Thunderbolts Poster

Trailer Thunderbolts*

Eles não são os heróis que conheces. São os que sobraram.
Num mundo mergulhado na incerteza, Valentina Allegra de Fontaine reúne um grupo de almas perdidas para fazer o impossível: salvar o mundo… ou destruí-lo.

Yelena Belova, Bucky Barnes, Red Guardian, John Walker, Ghost e Bob (Sentry) enfrentam a missão mais perigosa das suas vidas. Mas a verdadeira ameaça não vem de fora — vem de dentro. O Void ergue-se. E com ele, os fantasmas que nunca os deixaram.

A ação colide com a dor num filme onde a empatia é mais poderosa do que qualquer super-força.